Religião

Espiritismo perde Divaldo Franco. Haverá um sucessor?

Com a partida de grandes nomes da religião, surge a indagação se existem novas lideranças para ocupar esse espaço entre os espíritas

06/11/2014. Crédito: Ana Rayssa/Esp.CB/D.A Press. Brasil. Brasília - DF. Entrevista com o médium Divaldo Franco. -  (crédito: Ana Rayssa/Esp. CB/D.A Press)
06/11/2014. Crédito: Ana Rayssa/Esp.CB/D.A Press. Brasil. Brasília - DF. Entrevista com o médium Divaldo Franco. - (crédito: Ana Rayssa/Esp. CB/D.A Press)

O espiritismo sofreu uma grande perda no último dia 13, com o falecimento de Divaldo Franco, aos 98 anos, em decorrência de um câncer de bexiga. Professor, médium, escritor e um dos maiores divulgadores da doutrina espírita no Brasil e no mundo, Divaldo era carinhosamente chamado de "Paulo de Tarso do Espiritismo", em referência a São Paulo, um dos principais teólogos e pregadores do cristianismo. Sua trajetória deixa um legado profundo de fé, caridade e conhecimento espiritual que marcou gerações. Com sua desencarnação, termo utilizado pelos espíritas para se referir à morte, surge uma dúvida: Divaldo deixa um sucessor?

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Codificado por Allan Kardec no século 19, o espiritismo é uma doutrina filosófico-religiosa que busca a compreensão racional da fé. Fundamenta-se em três pilares: ciência, filosofia e religião. Seus princípios incluem a existência de Deus, a imortalidade da alma, a reencarnação, a comunicação entre vivos e espíritos e a lei de causa e efeito, o amor ao próximo e a caridade. Sem sacerdócio, culto externo ou cerimônias, o espiritismo é, por essência, descentralizado.

Por isso, não faz sentido falar em sucessão, segundo a religião. "No movimento espírita, não enfrentamos um problema de liderança. Nosso foco é o trabalho coletivo e a vivência dos princípios evangélicos. Mesmo sem uma figura carismática como Divaldo, o movimento segue firme, guiado por líderes que atuam com amor, humildade e responsabilidade em diversas frentes no Brasil", explica Carlos Campetti, vice-presidente da Federação Espírita Brasileira (FEB), localizada na quadra 603 Norte.

Carlos destaca que o espiritismo brasileiro é bem estruturado, com organização nacional, estadual e regional. A FEB atua como coordenadora do movimento no país, por meio do Conselho Federativo Nacional (CFN), que reúne representantes das entidades federativas de todos os estados. Esses representantes se reúnem anualmente em uma assembleia ordinária, em novembro, além de encontros extraordinários ao longo do ano e reuniões por comissões regionais. Nessas ocasiões, são debatidas estratégias, diretrizes doutrinárias e ações para manter viva a essência do espiritismo kardecista. "Divaldo tinha profundo respeito pela doutrina e trabalhou incansavelmente pela união da comunidade espírita. Por isso, é pouco provável que haja divisões internas", afirma Carlos.

Marta Antunes, ex-vice-presidente da FEB e amiga pessoal de Divaldo, lembra-se da liderança acolhedora exercida por ele. "Era um homem muito preparado no conhecimento do Evangelho e da doutrina espírita, e aplicava esses ensinamentos em sua vida diária. Nós o definimos como um verdadeiro 'homem de bem'", afirma. 

Ela destaca ainda que, apesar da saudade, a religião segue suas atividades normalmente. "O espiritismo vai prosseguindo com as suas atividades e realizações. É claro que nós estamos sentindo muita saudade do Divaldo, mas vamos prosseguir como aconteceu com outras lideranças no ado, a exemplo do Chico Xavier", completa. 

João Pinto Rabelo, diretor da FEB e da Mansão do Caminho, instituição fundada por Divaldo em Salvador, também compartilhou lembranças para a reportagem. "Divaldo exerceu papel crucial na divulgação do espiritismo no Brasil e no mundo. Foi um instrumento de solidariedade, luz e vivência da doutrina." Segundo ele, o médium visitou praticamente todo o território brasileiro e esteve em 72 países, onde ministrou palestras, seminários e encontros. Divaldo chegou a discursar na sede da ONU em mais de uma ocasião, sendo reconhecido como embaixador da paz.

"Guiado por espíritos nobres como sua mentora Joanna de Ângelis, Allan Kardec, Humberto de Campos e outros, Divaldo colocou sua mediunidade a serviço da luz. O resultado foi a publicação de 260 livros e a realização de mais de 20 mil conferências e palestras", conta Rabelo.

Carlos Campetti ressalta que esse vasto material constitui um verdadeiro tesouro doutrinário, que continuará a inspirar e orientar gerações futuras. "O espiritismo segue fortalecido pelo esforço coletivo. Agora, cabe a todos nós dar continuidade a esse legado, mantendo vivos os ideais cristãos que ele tanto defendeu."

 


Luzes do esperitismo

Divaldo Franco 

Nascido em 5 de maio de 1927, em Feira de Santana, na Bahia, Divaldo começou a mediunidade ainda na infância, porém era repreendido pela família. Após ser acometido por uma doença que o deixou acamado durante meses, a família, enfim, aceitou que uma médium o visitasse. Foi ela quem entendeu que ele era oprimido por um espírito e identificou sua mediunidade.

Divaldo ou a se dedicar integralmente ao espiritismo a partir da década de 1940. Tornou-se discípulo dos ensinamentos de Allan Kardec e ou a divulgar a doutrina espírita por meio de palestras, seminários e livros psicografados, muitos dos quais atribuídos ao espírito Joanna de Ângelis, sua principal mentora espiritual.

Ao longo de sua trajetória, Divaldo destacou-se não apenas pela sua capacidade mediúnica, mas também pela dedicação às causas sociais. Em 1952, fundou, junto a Nilson de Souza Pereira, a Mansão do Caminho, uma obra social localizada em Salvador, que acolhe e educa crianças em situação de vulnerabilidade. A instituição se tornou um modelo de assistência e educação, oferecendo serviços de saúde, ensino e apoio psicológico a milhares de pessoas.

Como conferencista, Divaldo percorreu diversos países, levando mensagens de paz, espiritualidade e fraternidade. Suas palestras sempre ressaltam valores como a caridade, o perdão e a importância do autoconhecimento. Escreveu ou psicografou mais de 250 livros, muitos traduzidos para diversos idiomas, ajudando a popularizar a doutrina espírita em diferentes partes do mundo.

Chico Xavier

Francisco Cândido Xavier, mais conhecido como Chico Xavier, foi um dos mais notáveis médiuns e filantropos do Brasil, nascido em 2 de abril de 1910, em Pedro Leopoldo, Minas Gerais. Desde a infância, demonstrava habilidades mediúnicas, afirmando ver e conversar com espíritos. Órfão de mãe aos cinco anos, enfrentou dificuldades na juventude, mas encontrou no Espiritismo o consolo e a orientação para sua vida. Em 1927, começou sua trajetória como médium psicógrafo, dedicando-se a transmitir mensagens atribuídas a espíritos desencarnados.

Chico Xavier psicografou mais de 400 livros ao longo da vida, sem jamais reivindicar os direitos autorais, destinando toda a renda das obras a instituições de caridade. Seus livros abordam temas diversos, como espiritualidade, moral cristã, reencarnação e vida após a morte. O mais famoso deles, Nosso Lar, ditado pelo espírito André Luiz, tornou-se referência na literatura espírita e foi adaptado para o cinema. Seu trabalho foi marcado pela humildade, pela fé e pelo compromisso com o próximo.

Além da produção literária, Chico dedicou sua vida ao atendimento espiritual de milhares de pessoas. Recebia cartas psicografadas de entes queridos falecidos, o que trouxe consolo a inúmeras famílias. Seu trabalho incansável em centros espíritas, principalmente em Uberaba, onde viveu por décadas, atraiu atenção nacional e internacional, tornando-o símbolo de caridade e esperança.

Chico Xavier faleceu em 30 de junho de 2002, aos 92 anos, deixando um legado espiritual e humano imensurável.

postado em 27/05/2025 07:00
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