
Presidente do Sindicato dos Delegados de Polícia Civil do DF (Sindepo-DF), a delegada Cláudia Alcântara, da Polícia Civil do Distrito Federal, acredita que a chamada Pec da Segurança Pública, em tramitação no Congresso, é uma tentativa ambiciosa e bem-vinda de atacar o crescimento do crime organizado no país. A policial, no entanto, avalia que o foco deveria ser a valorização das instituições já consolidadas, como as polícias judiciárias, e do trabalho regional.
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Segundo Cláudia Alcântara, as equipes que atuam nas cidades têm mais condições de trabalhar para reduzir a criminalidade pelo conhecimento das realidades locais. Dessa forma, a delegada aponta que a autonomia regional precisa ser preservada, para que iniciativas bem-sucedidas sejam mantidas e ampliadas, sem deixar de haver uma integração nacional.
Na condição de presidente do Sindepo-DF e de vice-presidente da Associação Nacional das Mulheres Policiais do Brasil (Ampol), ela afirma que trabalha em defesa da valorização das instituições de segurança pública, da autonomia federativa e da investigação criminal qualificada. "Segurança pública se realiza no território, com conhecimento de campo, redes locais e estrutura própria. Enfraquecer a atuação das Polícias Estaduais, especialmente das Polícias Civis e Militares, é um caminho perigoso que pode resultar em mais burocracia e menos eficiência", sustenta
Na sua avaliação, a Pec 18/25, a chamada Pec da Segurança Pública, é um avanço ou retrocesso?
Representa uma das tentativas mais ambiciosas de reorganização do sistema de segurança no país. Em tempos de crescimento da criminalidade organizada e de desafios complexos, é natural que o Congresso busque soluções estruturais. No entanto, a forma como essa proposta foi construída exige atenção, especialmente no que tange ao equilíbrio federativo, à valorização das instituições já consolidadas e à real efetividade das medidas previstas.
Por quê?
A PEC concentra na União poderes normativos e operacionais que podem comprometer a autonomia dos estados e do Distrito Federal. A coordenação nacional é essencial, sim, especialmente no enfrentamento a crimes interestaduais e transnacionais. Mas segurança pública se realiza no território, com conhecimento de campo, redes locais e estrutura própria. Enfraquecer a atuação das Polícias Estaduais, especialmente das Polícias Civis e Militares, é um caminho perigoso que pode resultar em mais burocracia e menos eficiência.
Como avalia o papel das guardas municipais?
Merece debate aprofundado a inclusão das guardas municipais como forças de segurança pública, com atribuições ostensivas. Embora seja legítimo fortalecer essas instituições, é necessário observar a ausência de padronização, controle hierárquico e formação técnica uniforme. Expandir competências sem critérios pode gerar sobreposição de funções, conflitos operacionais e insegurança jurídica — algo incompatível com um sistema que exige disciplina, planejamento e integração.
Quais são os pontos positivos?
A proposta traz pontos positivos, como a constitucionalização do Sistema Único de Segurança Pública (Susp) e dos fundos destinados à área. Isso garante maior estabilidade orçamentária e permite planejamento de longo prazo. No entanto, é essencial que essa blindagem venha acompanhada de critérios objetivos de ree e mecanismos de controle rigorosos, para que os recursos cheguem onde são mais necessários — e com resultados mensuráveis.
Qual a sua opinião sobre a criação da Polícia Viária Federal?
A substituição da atual Polícia Rodoviária Federal por uma nova Polícia Viária Federal, com atuação em rodovias, ferrovias e hidrovias, levanta dúvidas. Trata-se de uma inovação necessária ou apenas uma mudança simbólica? Antes de criar novos órgãos, o país precisa investir em inteligência, integração e tecnologia, fortalecendo o que já existe e funciona. Criar mais estruturas não é sinônimo de maior segurança.
A Polícia Judiciária é tratada como deveria na PEC?
Se há algo indispensável no combate ao crime organizado é a investigação qualificada e a responsabilização penal com observância do devido processo legal. As Polícias Civis dos Estados e do Distrito Federal — por meio dos seus Delegados e agentes — são as responsáveis por desarticular organizações criminosas, desmontar redes de corrupção e garantir provas robustas à Justiça. Nenhuma proposta de reforma será eficaz se desconsiderar esse papel técnico, jurídico e constitucional.
E o Conselho Nacional e participação federativa?
Por fim, a criação do Conselho Nacional de Segurança Pública e Defesa Social é um o importante, desde que sua composição seja democrática e paritária. Estados, Distrito Federal, municípios e sociedade civil devem ter voz real e capacidade de decisão. Um conselho consultivo, sem peso institucional, apenas repete o modelo ineficaz de tantas outras instâncias.
Qual é a sua visão geral sobre o que se discute na proposta em tramitação?
A PEC 18/2025 parte de uma premissa correta: o país precisa repensar sua segurança pública. Mas para ser um verdadeiro avanço, ela deve equilibrar protagonismo nacional com respeito à autonomia local, valorizar o que já funciona e corrigir distorções com base técnica, e não com disputas corporativas ou populismo legislativo. O futuro da segurança pública brasileira deve ser construído com responsabilidade, integração e respeito às instituições que, diariamente, garantem a ordem e a justiça em todos os cantos do país.