DOCUMENTÁRIO

Documentário traz retrato de Belchior em movimento de agricultores

O documentário Belchior entre os camponeses reúne depoimentos de cinco pessoas que conviveram com o cantor durante o período que ele foi acolhido pelo Movimento dos Pequenos Agricultores, no interior do Rio Grande do Sul

Único registro visual do tempo que Belchior ou no município de Seberi
 -  (crédito: Arquivo pessoal)
Único registro visual do tempo que Belchior ou no município de Seberi - (crédito: Arquivo pessoal)

Em 2013, Belchior, acompanhado pela esposa Edna, encontrava-se em uma peregrinação na busca de uma vida pacífica e anônima, em um auto-exílio que durou cerca de 10 anos. Com a constante perseguição da mídia, que procurava a todo custo encontrar o cantor "desaparecido", o casal saiu da capital Porto Alegre em direção ao município de Seberi, interior do Rio Grande do Sul, onde foram acolhidos pelo Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) e abrigados no centro de formação da cooperativa camponesa Coperbio. O período de 60 dias é evocado no documentário Belchior entre os camponeses, disponível, gratuitamente, no YouTube, com depoimentos de cinco voluntários que conviveram, diariamente, com o artista.

Dirigido por Marcos Antonio Corbari, o curta de pouco mais de 30 minutos surgiu a partir do desejo das pessoas que estiveram com Belchior e Edna durante os dois meses em compartilhar o convívio. "Em 2017, quando ele morreu, o pessoal da cooperativa me chamou, porque gostariam de trazer essa informação a público. Até então, eles nunca haviam comentado nada a respeito, inclusive, honrando um acordo feito com o próprio artista de não relatar nada até a morte dele", contou o diretor.

Na época, a história chegou a ser noticiada em alguns jornais locais, sem muita repercussão. "A estada de Belchior em Seberi se tornou uma coisa meio folclórica, inclusive muita gente se negava a acreditar que isso aconteceu. Achavam que era uma história inventada, sendo que nos livros em que ele é biografado essa agem está citada", apontou Marcos. "Eu sempre fiquei muito incomodado com isso, então eu tinha esse sonho de fazer um documentário que de fato registrasse e tornasse pública essa informação", disse.

Segundo o diretor, a intenção do documentário também foi registrar uma parte pouco conhecida da vida de Belchior. "A gente tinha receio de ser criticado, porque é uma peça extremamente simples, apenas um fio narrativo que não procura explorar questões pesadas, que já foram muito exploradas, como o motivo do sumiço dele. O pessoal falava que era dívida, loucura ou manipulação. Em nenhum momento, a gente teve interesse de tirar proveito desse sensacionalismo", garantiu.

O grande objetivo, de acordo com Marcos, era mostrar o ser humano por trás da figura mítica do artista. "Os próprios voluntários relatam que conviveram com o tio Antônio, não com o cantor", destacou. O apelido carinhoso surgiu de um pedido do cearense de não ser chamado de Belchior.

Siga o canal do Correio no WhatsApp e receba as principais notícias do dia no seu celular

"Talvez isso seja o que faltava aparecer do período de auto exílio dele. O aspecto crítico já foi muito explorado, mostrado e conjecturado. Já existem muitas teorias da conspiração em relação a isso. Mas as pessoas que conviveram com ele nesse meio-tempo têm histórias humanas para contar. E são essas histórias que ainda não foram mostradas", declarou.

O diretor espera que o documentário sirva de incentivo para que outras pessoas que conviveram com Belchior também contem as próprias experiências. "Eu tenho certeza que existem inúmeras histórias bonitas para se contar desse período, que são muito mais interessantes que essas teorias da conspiração que se somam para um personagem que, infelizmente, não está mais aqui para se defender", afirmou Marcos.

Durante 60 dias, Belchior e Edna, artista plástica, dedicaram-se à arte de forma particular e privada — liam, escreviam e ouviam música. Em meio a uma rotina reservada, o casal se dispôs a criar a imagem símbolo de um projeto da cooperativa que defende a produção sustentável de unidades produtivas camponesas e na implementação de agroflorestas.

Após dois meses, partiu dos dois a decisão de deixar Seberi e seguir para Santa Cruz do Sul, ainda no Rio Grande do Sul, onde foram acolhidos por uma rede de amigos e iradores. Lá, o casal ficou por quase quatro anos, até a morte de Belchior. "O fluxo de pessoas do ambiente de o público gerava um tanto de incômodo para eles, e também havia uma sobrecarga de trabalho para o pessoal, porque, quando havia uma circulação maior de pessoas, era mais difícil mantê-los ocultos", explicou o diretor.

Em Seberi, o único registro do rapaz latino-americano é uma foto dele junto aos voluntários, em uma cachoeira localizada na comunidade rural Linha Tesoura, no interior do município. "Recentemente, começou a ser discutida na prefeitura e na Câmara de Vereadores a proposta de projeto de lei para oficialmente colocar o nome da cachoeira de Antônio Carlos Belchior", compartilhou Marcos. De acordo com ele, a cascata natural já é popularmente chamada de Cachoeira do Belchior.

"Um pequeno município dificilmente é comentado além da sua região, a não ser quando acontecem acidentes, tragédias, coisas muito ruins. No entanto, nós estamos, desde dezembro, com o nome do município sendo associado a uma história bonita", celebrou. A expectativa é de que o novo nome da cachoeira seja oficializado até meados de março.

 


  • Belchior e a esposa Edna criaram a imagem símbolo de um dos projetos da cooperativa
    Belchior e a esposa Edna criaram a imagem símbolo de um dos projetos da cooperativa Foto: Arquivo pessoal
  • Aponte a câmera do celular para o QR Code e assista ao documentário Belchior entre os camponeses
    Aponte a câmera do celular para o QR Code e assista ao documentário Belchior entre os camponeses Foto: QR Code
Isabela Berrogain
postado em 26/02/2025 07:15
x