O ator e performer Luca Lima buscou na leveza e no humor os instrumentos para falar de uma realidade complexa e espinhosa. Na peça Demos, o brasiliense reflete sobre polarização e dificuldade de comunicação. O monólogo de 40 minutos nasceu em 2018 da necessidade de falar sobre um país dividido. "Um país que não escutava e não se escuta. A partir disso, me coloquei muito nesse exercício do autor e do dramaturgo. E a segunda motivação é a necessidade de dizer as palavras e comunicá-las aos outros", explica Luca.
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Um encontro com a coreógrafa Denise Stoklos deu um impulso final para definir os contornos de Demos. Luca sempre irou e estudou o teatro essencial, técnica criada pela coreógrafa, e, em 2020, participou de um trabalho de Stoklos, que acabou por convidá-lo para apresentar o espetáculo no Festival Internacional Denise Stoklos de Solo Performance, em 2022. "Foi muito forte para mim porque vi nela a possibilidade de continuidade daquele trabalho com uma linguagem que me identifiquei muitíssimo. A partir desse encontro, fui estudar mímica e ganhar estofo técnico", conta.
São muitos os significados da palavra demos, que nomeia a peça, mas Luca não se preocupa em assumir nenhuma delas e muito menos em explicá-las. "É uma palavra que pode suscitar muitos possíveis significados e não tenho preocupação em responder de fato o que significa, até porque essa palavra foi virando outras coisas ao longo do tempo", diz. O texto que ele leva ao palco é o que chama de "fala-fluxo" ou "fala-rio". "Porque a palavra ainda é o principal do trabalho, o cuidado com a palavra é muito importante", explica Luca, que faz o monólogo em tom de conversa com o público.
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Totalmente autoral, o texto abre lacunas em vez de responder questões. A intenção do autor é provocar reflexões sobre o impacto da falta de escuta nas dinâmicas sociais. "E pensar sempre no teatro como o lugar em que a gente pode se reunir para esse tipo de reflexão num mundo em que a tecnologia está cada vez mais avançada", explica. "O teatro, para mim, ocupa o pensamento de que o ser humano, num mundo tecnológico, precisa de um encontro que reuna gente viva com gente viva. Isso precede qualquer mediação", acredita.
Para falar sobre a falta de escuta, Luca traz poemas de Carlos Drummond de Andrade, canções de Maria Bethânia e Gonzaguinha e outras referências brasileiras. "Tudo que, por amor, reverbera muito forte em termos de brasilidade. Autores, músicos e poetas estão muito presentes na peça, porque ajudam a tecer o fio reflexivo do qual lanço mão", garante o ator.
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Com Luca Lima. Amanhã e domingo, às 19h, na Casa dos Quatro (SCLRN 708 Bloco F Loja 1). Não recomendado para menores de 16 anos. Ingressos: R$ 50 e R$ 25 (meia), no Sympla