
Tal qual um ataque rápido no vôlei de praia, os primeiros 100 dias da nova gestão do Comitê Olímpico do Brasil (COB) aram em um piscar de olhos. Mirando implementar a cultura de Nação Esportiva no país, a equipe liderada pelo presidente Marco La Porta assumiu diante de missões urgentes nos campos esportivo, institucional e de articulação política. Hoje, o grupo atinge a marca centenária satisfeita com o trabalho feito e confiante em um futuro ainda melhor. Em entrevista ao Correio, o diretor-geral Emanuel Rego faz balanço positivo do período.
Multicampeão representando as cores do Brasil nas quadras de areia, inclusive com medalhas olímpicas, a lenda de uma das modalidades mais queridas pelos brasileiros — e rentáveis em termos de conquistas olímpicas — se entregou de corpo e alma ao desafio de entregar mais ao esporte do país, agora na gestão. Emanuel não é marinheiro de primeira viagem em funções do tipo e aplica justamente a versatilidade política para entregar transformações no COB. O gestor destaca, justamente, o poder de relacionamento como "arma" para cumprir a missão.
Nos primeiros 100 dias, a gestão do COB trabalhou para adequar o funcionamento dos processos da entidade e entregou resultados em temas importantes, como a candidatura de Rio-Niterói para o Pan-2031 e a organização dos Jogos da Juventude, em setembro, em Brasília. Ao mesmo tempo, focou em pontos para evoluir internamente, além de batalhar nos campos políticos por melhorias no esporte. Se, por um lado, o sentimento é de satisfação pela mudança entregue, Emanuel garante: há margem para fazer muito mais.
Como avalia os primeiros 100 dias da nova gestão do COB?
Estou muito satisfeito. Minha vida foi baseada no esporte olímpico, desde atleta. Na segunda parte, fui presidente da Comissão de Atletas. Depois, representante da Confederação. E, hoje, vendo a gestão do La Porta, junto a Yane, vejo que trouxeram um novo momento para o COB. Uma visão mais clara, tentando fazer uma gestão moderna, participativa e transparente. São os os iniciais que vi. Com relação à minha parte, foquei no planejamento estratégico, trazer essas ideias que pensaram na campanha. Fizemos a grande mudança.
Como encontraram a casa? O processo de transição interferiu?
Confesso que foi a primeira vez que teve uma transição. É uma coisa nova. Geralmente, se ava diretamente de uma gestão para outra, que era conjugada. Como foi inédito, não sabíamos o que esperar. Mas, quando estamos motivados para gerir, sempre esperamos mais informação e tempo para se preparar, não só quando se senta na cadeira. Tenho certeza de que nós, como gestores, sempre tentamos ter mais informações para sermos mais assertivos. Isso faltou um pouquinho. Se tivesse, teríamos feito mais nesses 100 dias. Mas nós estamos com um grupo muito bom. A Manoela Penna trabalha muito bem a comunicação e o marketing. Marcelo Vido veio com a experiência dele, do Flamengo, de gestão. O nosso consultor, o Jorge Bichara, já trabalhou conosco. Eu também venho com uma missão de fazer mais as questões institucionais internas. No final das contas, fizemos muitas coisas. Mais do que esperávamos.
O que destaca desse espectro?
A primeira era trazer um ambiente mais saudável, fazer uma comunicação interna. Tive muitas reuniões com todas as áreas, apresentando o modelo de gestão, de comunicação, de estar com a porta aberta da diretoria para receber os colaboradores. Nesses 100 dias, senti todos muito disponíveis. O que eu mais curto no Comitê é todos buscarem a excelência. Não só no esporte, entregando aos atletas, mas dentro do COB, cada um tenta fazer a sua parte melhor. É como se fosse uma continuidade do esporte olímpico que a gente entrega aos atletas dentro do Comitê. Estávamos muito focados que a representação fosse mais de liderança.
E quais as propostas para isso?
Uma era criar um núcleo de relações institucionais. Tem uma pessoa específica em Brasília, com foco na comunicação com o Ministério do Esporte, com o Parlamento, com as confederações. O segundo fica em São Paulo para buscar recursos e parceria com grandes empresas. Foi o foco maior da minha gestão, a parte institucional.
De forma pessoal, como foram os 100 dias para o gestor Emanuel?
Temos confiança plena uns nos outros. Estamos em três diretores. Facilita a comunicação. Um dos objetivos era contratar uma consultaria externa. Veio a Deloitte nos ajudar na readequação estrutural, melhorar os processos e ver cargos e salários. Diminuindo o número de diretorias, ficou mais rápido. Eu fui a Brasília, tive reuniões excelentes com relação ao legado de Deodoro. Também falamos com o Ministério da Defesa. Conversei com as confederações do pentatlo, do hipismo, do hóquei na grama e do tiro esportivo. Minha grande arma é o meu relacionamento. Estou aproveitando isso ao máximo para melhorar as relações do COB.
Estamos nos aproximando dos Jogos da Juventude em Brasília. Como está a preparação?
Os Jogos da Juventude são o sonho de todo jovem. Esses atletas, de 15 a 17 anos, já decidiram o esporte que querem. Estão competindo, almejando a evolução. E os Jogos são uma oportunidade para os atletas que participam dos regionais, dos estaduais, representem os estados. Chegam com uma experiência grande. Vai ser gratificante fazer em Brasília. É uma das cidades com maior infraestrutura esportiva, logística, de competência. Em 2017, participei como embaixador e eu sei o quanto é bacana. Voltar é sempre interessante, a gente consegue desenvolver mais. Podemos estar mais próximos de todas as regiões do Brasil.
Qual o nível da relação com o GDF?
Os gestores do GDF são parceiros do COB. Tenho uma relação ótima com o Renato Junqueira (secretário de Esportes). Quando se tem relação de gestores, proporciona novas parcerias. A visão do COB é aproveitar gestores que fazem para o esporte. Brasília tem o Compete. Deveria ser exemplo para todos os estados. Consegue distribuir recursos para os atletas competirem. Isso é um dos programas mais valorosos. O COB faz isso, mas através das confederações. Descentralizamos recursos para isso. É a competição que faz a evolução do atleta. Minha relação com o GDF é muito ampla e aberta. Quando pensamos no esporte, temos que estar próximo de quem executa.
A gestão começou com questões políticas a serem resolvidas, como a Lei de Incentivo ao Esporte… qual o avanço na articulação?
A Lei Geral do Esporte contempla a Lei de Incentivo ao Esporte e a lei de isenção fiscal para compra de material esportivo, mas houve os vetos do governo federal. Em uma reunião com o Ministério do Esporte, tocamos nesse assunto. Neste momento por qual o esporte a, o primeiro ano do ciclo olímpico, precisamos que as confederações renovem o parque de equipamentos. Saímos com uma linha de condução para fazermos uma pesquisa, quais precisam comprar equipamentos e qual seria o custo para, em um segundo momento, apresentar para o Ministério e fazer uma reunião específica com quem lida com a isenção.
Há interesse do COB em fomentar?
O COB nunca fez projetos com a LIE, mas essa gestão gostaria de utilizar o recurso no fomento. Apresentamos um projeto ao Ministério do Esporte para a construção de dois polos nos Jogos da Juventude. Fizemos um piloto e conseguimos a aprovação. Podemos utilizar esses recursos, não para o alto rendimento, mas outras áreas, de solidariedade esportiva, no museu esportivo.
Qual seria o retrocesso se houvesse alteração severa na LIE?
Somos acostumados a ver o alto rendimento, mas, se tivermos um olhar mais claro que a lei de incentivo nos proporciona, ela considera o esporte de desenvolvimento, de inclusão social. A lei é muito maior do que imaginamos. Muitas vezes, pensamos no resultado, os atletas chegando a uma competição. A lei de incentivo contempla, realmente, a humanização através do esporte. Muitas entidades fazem um ótimo trabalho. Às vezes, não tem o holofote, mas estão ali construindo cidadãos melhores através do esporte. Temos que focar nisso.
É possível detalhar o que se tem de concreto no plano Los Angeles-2028?
No modelo anterior, de 2021 a 2024, existiam duas áreas específicas no esporte: o desenvolvimento, que cuidava dos atletas em formação, e o alto rendimento. Com a nossa entrada, unificamos para o investimento ser direto e incisivo. Foi criado um sistema, chamado Top 5. Os atletas ou equipes que estão entre os cinco melhores nos rankings mundiais vão ter acompanhamento direto do COB, através da parte de saúde do esporte, psicologia, testes físicos, acompanhamento. Esse é o foco para os atletas performarem daqui a quatro anos.
A que pé está a candidatura pelo Pan-2031, com Rio-Niterói?
Tivemos uma assembleia-geral extraordinária para apresentação da candidatura. Quando chega de uma Prefeitura, a pelo COB. Com as confederações, damos uma chancela positiva. Foi a primeira fase. A segunda é a apresentação do caderno de encargos. Neste momento, o COB fica como um observador. O trabalho total é das prefeituras. Vamos ter uma assembleia-geral hoje, na qual vai ser apresentado esse caderno, que vai para a Panam Sports, para podermos apoiá-los politicamente.
O que seria esse apoio político?
É conversar com os outros comitês olímpicos nacionais para tentar proporcionar a oportunidade. É demonstrar o nosso interesse de ser sede. É sempre muito interessante isso, porque há uma evolução, há uma atualização das infraestruturas existentes.
Como vê a união municipal, estadual e federal pelo Pan-2031?
Demonstra o quanto o esporte olímpico é forte no país. Quando se traz um evento grande, todas as confederações têm uma visão de melhora. E como é um processo longo, há tempo suficiente para fazer os projetos. Seis anos, na realidade, são quase a criação de uma nova geração. No ano seguinte a esse Pan, vai ter a Olimpíada de Brisbane, na Austrália. É uma continuidade. É importante ter esse apoio de todas as esferas. Eu acredito que o Rio de Janeiro tem uma experiência, como sediou os Jogos Olímpicos. Isso é importante. Praticamente 85% das estruturas estão prontas. É um requisito. Espero que tenha mais dessas instalações em Niterói, para que a população aproveite.
Como está a relação com os atletas? Houve uma fala sua de que isso é um princípio da gestão…
Muito satisfatória. Quando assumimos, fizemos um trabalho de imersão. Durante dois dias, apresentamos tudo que acontece dentro do Comitê. A parte financeira, istração, prestação de contas, organização, controle de viagens, orçamentos. Era uma das dúvidas que eu tinha: o que o COB faz? Todos os atletas da Comissão têm uma noção plena de todos os processos e as políticas. Hoje, o COB é um órgão muito bem organizado. Temos políticas, processos, manuais. As políticas de proteção contra abuso moral, assédio. Tem todo um arcabouço que, muitas vezes, as pessoas externas ao mundo esportivo não conhecem.
Brasília está recebendo eventos do vôlei de praia. A fase atual da modalidade te agrada?
Estou considerando Brasília a segunda terra natal do vôlei de praia. Quando tem eventos na cidade, é uma motivação. Gostei muito de ver as pessoas torcendo na arquibancada. As mulheres sempre dão um show. Está acontecendo com naturalidade. A Carol Solberg e a Rebecca demonstram que, realmente, são uma dupla nova com qualidade. Uma comissão técnica boa faz resultado. Elas são um grande exemplo. Duda e Ana Patrícia estão voltando, depois de um ciclo de parada. No feminino, estamos bem representados.
E como vê o masculino?
A gente viu o Evandro e o Arthur supermotivados por jogarem em casa. Eu gostei disso. A Europa, em geral, continua um pouco acima na parte técnica. Estão tendo uma competição maior entre eles, fazendo intercâmbios maiores. Talvez, seja isso que precisamos fazer. Tanto os americanos como os brasileiros, estamos ficando um pouquinho abaixo do nível técnico deles. Jogamos, praticamente, somente no nosso nível, nos nossos campeonatos internos. Nisso, temos que aprender um pouquinho com os europeus para evoluir.
ados 100 dias do desafio, de que forma prospecta o futuro da gestão olímpica?
A primeira coisa que estamos fazendo é criar um selo de certificação do COB para centros de treinamento locais e das confederações. Quando colocamos uma certificação, fazemos uma avaliação. Com o selo do COB, recursos públicos podem ser inseridos diretamente. No Ministério, existe a Rede Nacional de Esporte. São centros que podem receber recursos diretamente, sem ar por nenhum outro processo. Isso é muito favorável ao desenvolvimento do esporte. Esse é um grande foco nosso para fomentar.