
Desde uma injeção de desinfetante contra a Covid-19 até tomar o controle da Faixa de Gaza, Donald Trump lança há tempos sugestões extravagantes para resolver os problemas do mundo. Mas a pergunta que fica é sempre a mesma: ele deve ser levado a sério?
Diante da imprevisibilidade do presidente americano, seus críticos se questionam se ele estaria fazendo uma proposta séria, blefando para assumir o controle de uma negociação ou simplesmente criando uma distração.
Trump se orgulha de ser um disruptor político, e sua sugestão de expulsar os palestinos e tornar a Faixa de Gaza "a Costa Azul do Oriente Médio" é um exemplo disso. "Muito do que ele diz é uma hipérbole, uma negociação inteligente e algo sério, tudo ao mesmo tempo", diz o diretor da Escola de Mídia da Universidade George Washington, Peter Loge.
"Quando ele diz coisas aparentemente escandalosas que não acontecem, faz com que isso e como uma piada ou tática de negociação. Quando o plano ocasional funciona, afirma ser um gênio", explica Loge.
A tática favorita de Trump é deixar as pessoas em dúvida, explicou em 2016 a jornalista Salena Zito, quando disse que a imprensa leva Trump "ao pé da letra, mas não a sério", enquanto seus partidários fazem o contrário.
'Original'
Adversários de Trump já lamentaram não terem levado o presidente a sério. Muitos o deram como carta fora do baralho depois que ele tentou reverter a derrota eleitoral de 2020, mas Trump voltou. Depois, questionaram se ele colocaria em prática a agenda radical de direita que prometeu na campanha eleitoral de 2024.
A resposta foi que sim. Trump lançou um programa contra os imigrantes, as pessoas transgênero e o governo federal. Mas muitas dessas medidas terão que superar obstáculos nos tribunais ou no Congresso, onde ele conta com uma maioria apertada.
A proposta referente à Faixa de Gaza dá um o além, por ser imprevisível. Sorridente, o premier de Israel, Benjamin Netanyahu, elogiou Trump por "ser original". "Você diz coisas que os outros se negam a dizer. E, após ficarem boquiabertas, as pessoas coçam a cabeça e dizem: 'Você tem razão.'"
Líderes do Oriente Médio, no entanto, discordam. Em meio à falta de detalhes, a Casa Branca e o Departamento de Estado tiveram que dar um o atrás e esclarecer que a medida seria temporária e que os Estados Unidos não enviariam tropas para o território palestino, pelo menos por enquanto.
A arte de negociar
Especialistas sugerem que as tiradas de Trump se encaixam em diferentes estratégias. Muitas vezes, são úteis para desviar a atenção de problemas políticos urgentes.
A pesquisadora do Instituto do Oriente Médio em Washington Mirette Mabrouk acredita que as propostas recentes de Trump mascaram o fato de ele ainda não ter conseguido reduzir a inflação como prometeu. Em outras ocasiões, o presidente americano, autor do livro "A Arte da Negociação", parece usá-las como uma verdadeira ferramenta de negociação.
Trump pareceu usar essa tática quando ameaçou impor tarifas aos aliados México e Canadá e as suspendeu depois que eles concordaram em tomar medidas de segurança na fronteira. Mas nem tudo era o que parecia. Algumas das medidas canadenses haviam sido anunciadas meses antes.
A carreira de Trump como magnata do setor imobiliário talvez jogue luz sobre o assunto. Suas propostas para a Faixa de Gaza, Groenlândia e o Panamá soam como acordos imobiliários.
No ano ado, o republicano descreveu a Faixa de Gaza "como Mônaco", enquanto seu genro Jared Kushner sugeriu que Israel esvaziasse o território de palestinos para desbloquear "propriedades à beira-mar".